terça-feira, 15 de setembro de 2009

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

quarta-feira, 26 de agosto de 2009



Pobres e sem vida (notícias) neste mísero Portugal



Coitadinhos dos fotógrafos. Coitadinhos dos jornalistas. Ninguém os compreende. Portam-se tão bem, fazem um trabalho tão árduo e sério, sempre com o intuito de "informar" os cidadãos e ainda por cima tentam "assassiná-los". E quem é o culpado deste mundo cão e criminoso, quem é? É o senhor Pinto da Costa, quem mais havia de ser?


Há escroques em todo o lado, mas é preciso enfatizar com frequência que no jornalismo é onde se nota mais. Começou o campeonato, começou a caça ao homem. Aí está a praga nojenta de alcoviteiros e desrespeitadores ao ataque. Já começam a andar com o nome de Pinto da Costa na baila e sempre pelas piores razões. Mas será que estes imbecis, estes atrasados mentais, convencidos, ainda não perceberam que estão a tentar fazer de nós parvos?


Os paparazzi, essa espécie de marginais que também gostam de puxar os galões de jornalistas, não são muito diferentes destes patetas que tudo fazem para fabricar casos para prejudicar Pinto da Costa e por tabela o FCPorto. Ontem só faltou dizer que Pinto da Costa viajava de metralhadora em punho.


Depois, foi a telenovela com o Adriano. Andaram a esmiuçar, a ver se conseguiam arranjar um enredo qualquer para induzir o povo a acreditar em mais uma sacanice à moda do Porto [leia-se FCPorto]. Mas quem é que põe mão a isto? É isto aquilo a que eles chamam liberdade? É? Então venha a Ditadura, porque com esta democracia é impossível conviver.


ps.
Foram gajos como estes que assassinaram a princesa Diane num túnel de Paris!


quinta-feira, 20 de agosto de 2009



Com toda a sinceridade, devo dizer que contemporizei com a segunda guerra ao Iraque. Na sequência do mundo saído do 11 de Setembro, pareceu-me ser ali um dos nós da luta contra o terrorismo, especificamente por via das relações com o conflito entre israelitas e palestinianos. Pouco reflectidamente, não aquilatei das possibilidades da ideia e do propósito da potencial bola de neve democrática na região, como então o pretendiam os conselheiros da administração Bush. Não vou aqui discutir as razões do primeiro dos anteriores pressupostos, mas tenho que admitir a minha ingenuidade em face do segundo.
Sem me querer estar a defender do erro pretérito a que aludi e mesmo admitindo que as consequências mais positivas da alteração naquele país do Oriente Médio ainda estão para vir, a verdade é que os factos não autorizam qualquer olhar benevolente perante toda a forma como o processo foi conduzido por parte dos nossos Aliados. Olhando friamente os dados sobre a mesa, o saldo que até agora é possível fazer, se do ponto de vista social e político, para os iraquianos não vai além de um verdadeiro desastre e, para os ocidentais, também não vai além desse patamar, já do ponto de vista económico, aquilo que se verificou foi uma nova fonte de negócios que a própria guerra gerou. E de forma diversa do passado, não estamos agora apenas a falar das tradicionais reconstruções ou dos reenquadramentos do controle de fontes de energia, no caso e em particular o petróleo e o gás natural; como esta notícia deixa claro, estamos a verificar o florescimento do envolvimento mercenário ¿que outro termo será possível aplicar aqui?- de interesses privados na própria execução das operações bélicas. Infelizmente para toda a Humanidade, sedenta que está de paz e trabalho, se perguntarmos quem tem lucrado com as consequências daquela invasão e do estado de guerra que lhe sucedeu, a resposta vai sobretudo na direcção desses interesses particulares e mais ou menos esconsos.
Com isto, os ocidentais alienaram grande parte do capital moral que a declaração de guerra que foi o acto terrorista em 11 de Setembro de 2001 lhes trouxera, uma boa década decorrida sobre o desperdício político e social que se seguiu à queda do Muro de Berlim e ao fim do bloco comunista. A verdade é que um capitalismo financeiro selvagem ditou os seus ditames aos poderes políticos e em vez de um apoio total à ainda então União Soviética, no sentido de aí promover a abertura em direcção a um estado de direito, deu-se a mão àqueles que mais não queriam que repartir o bolo em seu ávido benefício e assim se deixou que a Rússia saída do comunismo viva a situação que hoje lhe podemos observar e que nada tem a ver com uma sociedade livre e democrática, muito menos desenvolvida e justa. Aqui pergunto-me se grande parte destas culpas não estará nas esquerdas norte-americana e europeias que, sem propostas de um mundo alternativo à lógica desse tal capitalismo financeiro selvagem, sucumbiram perante a ilusão de um mundo de hiper-consumo alimentado pelo crédito. Pois mais uma vez a história se repetiu e a ganância voltou a falar mais alto que a dignidade dos homens.
Não estranha pois que a própria guerra volte a ser contratada a exércitos privados, coisa que na História europeia não tem nada de estranho. Mas é um recuo civilizacional, pois é a melhor prova de como os interesses egoístas se estão a sobrepor ao estado de direito.
São os ciclos milenares em que a liberdade recua depois de um rasgo de vislumbre da luz do dia. Mas os homens de bem sabem que jamais a alguém foi permitido baixar os braços nesse lado da justiça que sempre foi conquistada pelo suor e a dor de muitos e tantas e tantas vezes com o sangue dos inocentes.

domingo, 19 de julho de 2009




Há uns tempos a Joana
- Pai acabei um namoro à homem
Perguntei como era acabar um namoro à homem e vai a miúda
- Disse-lhe o problema não está em ti, está em mim
o que me fez pensar como as mulheres são corajosas e os homens cobardes. Em primeiro lugar só terminam urna relação quando têm outra Em segundo lugar são incapazes de
- Já não gosto de ti
de
- Não quero mais
chegam com discursos vagos circulares
- Preciso de tempo para pensar
- Não é que não te amo, amo-te, mas tenho de ficar sozinho umas semanas
ou declarações no género de
- Tu mereces melhor do que eu
- Estive a reflectir e acho que não te faço feliz
- Necessito de um mês de solidão para sentir a tua falta
e aos amigos
- Dá-me os parabéns que lá me consegui livrar da chata
- Custou mas foi
- Amandei-lhe aquelas lérias do costume e a gaja engoliu
- Chora um dia ou dois e passa-lhe
e pergunto-me se os homens gostam verdadeiramente das mulheres
Em geral querem uma empregada que lhes resolva o quotidiano e com quem durmam, uma companhia porque têm pavor da solidão, alguém que os ampare nas diarreias, nos colarinhos das camisas e nas gripes, tome conta dos filhos e não os aborreça. Não se apaixonam, entusiasmam-se e nem chegam a conhecer com quem estão. Ignoram o que ela sonha, instalam-se no sofá do dia a dia, incapazes de introduzir o inesperado na rotina, só são ternos quando querem fazer amor e acabado o amor arranjam um pretexto para se levantar
(chichi, sede, fome, a janela de que se esqueceram de baixar, o estore)
ou fingem que dormem, porque não há paciência para abraços e festinhas, pá, e a respiração dela faz-me comichão nas costas, a mania de ficarem agarrados à gente no ronhónhó, a mania das ternuras, dos beijos, quem é que atura aquilo?
Lembro-me de um sujeito que explicava
- O maior prazer que me dá ter relações com a minha mulher é pensar que durante urna semana estou safo
e depois pegam-nos na mão no cinema, encostam-se, colam-se, contam histórias sem interesse nenhum, que nunca mais terminam, querem variar de restaurante, querem namoro, diminutivos, palermices e nós ali a aturá-las. O Dinis Machado contava-me de um conhecedor que lhe aclarava as ideias
- As mulheres têm fios desligados e um outro elucidou-me que eram como os telefones: avariam-se sem que se entenda a razão, emudecem, não funcionam e o remédio é bater com o aparelho na mesa para que comecem a trabalhar outra vez.
Meu Deus que pena me dão as mulheres. Se informam
- Já não gosto de ti
se informam
- Não quero mais
aí estão eles a alterarem a agressividade com a súplica, ora violentos ora infantis, a fazerem esperas, a chorarem nos SMS a levantarem a mãozinha e, no instante seguinte, a ameaçarem matar-se, a perseguirem, a insistirem, a fazerem figuras tristes, a escreverem cartas lamentosas e ameaçadoras, a entrarem pelo emprego dentro, a pegarem no braço, a sacudirem, a mandarem flores, eles que nunca mandavam flores, a colocarem-se de plantão à porta dado que aquela puta há-de ter outro e vai pagá-las, dispostos a partes gagas, cenas ridículas, gritos.
A miséria da maior parte dos casais, elas a sonharem com o Zorro, Che Guevara ou eu, e eles a sonharem com o decote da vizinha de baixo, de maneira que ao irem para a cama são quatro: os dois que lá se deitam e os outros dois com quem sonham. Sinceramente as minhas filhas preocupam-me: receio que lhes caia na sorte um caramelo que passe à frente delas nas portas, não lhes abra o carro, desapareça logo a seguir por chichi-sede fome-persiana-mal-descida-e-os-ladrões-percebes, não se levante quando entram, comece a comer primeiro e um belo dia
(para citar noventa por cento dos escritores portugueses)
- O problema não está em ti, está em mim a mexerem na faca à mesa ou a atormentarem a argola do guardanapo, cobardes como sempre. Não tenho nada contra os homens: até gosto de alguns. Dos meus amigos. De Schubert. De Ovídio. De Horácio. De Virgílio de Velásquez. De Rui Costa. De Einzenberger. Razoável, a minha colecção. Não tenho nada contra os homens a não ser no que se refere às mulheres. E não me excluo: fui cobarde, idiota, desonesto.
Fui.
(espero que não muitas vezes)
Rasca. Volta e meia surge-me na cabeça uma frase de Conrad em que ele comenta que tudo o que a vida nos pode dar é um certo conhecimento dela que chega tarde demais. Resta-me esperar que ainda não seja tarde para mim. A partir de certa altura deixa de se jogar às cartas connosco mesmos e de fazer batota com os outros. O problema não está em ti está em mim, que extraordinária treta. Como os elogios que vêm logo depois: és inteligente, és sensível, és boa, és generosa, oxalá encontres etc., que mulher não ouviu bugigangas destas?
Uma amiga contou-me que o marido iniciou o discurso habitual
- Mereces melhor que eu
levou como resposta
- Pois mereço. Rua.
Enfim, mais ou menos isto, e estou a ver a cara dele à banda. Nem uma lágrima para amostra. Rua. A mesma lágrima para amostra. Rua. A mesma amiga para uma amiga sua
- O que faço às cartas de amor que me escreveu?
E a amiga sua
- Manda-lhas Pode ser que lhe façam falta. Fazem de certeza: é só copiar mudando o nome. Perguntei à minha amiga
- E depois de ele se ir embora?
- Depois chorei um bocado e passou-me.
Ontem jantámos juntos. Fumámos um cigarro no automóvel dela, fui para casa e comecei a escrever isto. Palavra de honra que na janela uma árvore a sorrir-me. Podem não acreditar mas uma árvore a sorrir-me.

"António Lobo Antunes, Crónica da Visão"

quinta-feira, 9 de julho de 2009

É o país que temos...


Esta noite sonhei com o Mário Lino - por Miguel de Sousa Tavares


Segunda-feira passada, a meio da tarde, faço a A-6, em direcção a Espanha e na companhia de uma amiga estrangeira; quarta-feira de manhã, refaço o mesmo percurso, em sentido inverso, rumo a Lisboa. Tanto para lá como para cá, é uma auto-estrada luxuosa e fantasma. Em contrapartida, numa breve incursão pela estrada nacional, entre Arraiolos e Borba, vamos encontrar um trânsito cerrado, composto esmagadoramente por camiões de mercadorias espanhóis. Vinda de um país onde as auto-estradas estão sempre cheias, ela está espantada com o que vê:


- É sempre assim, esta auto-estrada?


- Assim, como ?


- Deserta, magnífica, sem trânsito?


- É, é sempre assim.


- Todos os dias?


- Todos, menos ao domingo, que sempre tem mais gente.


- Mas, se não há trânsito, porque a fizeram?


- Porque havia dinheiro para gastar dos Fundos Europeus, e porque diziam que o desenvolvimento era isto.


- E têm mais auto-estradas destas?


- Várias e ainda temos outras em construção: só de Lisboa para o Porto , vamos ficar com três. Entre S. Paulo e o Rio de Janeiro , por exemplo, não há nenhuma: só uns quilómetros à saída de S. Paulo e outros à chegada ao Rio . Nós vamos ter três entre o Porto e Lisboa: é a aposta no automóvel, na poupança de energia, nos acordos de Quioto, etc. - respondi, rindo-me.


- E, já agora, porque é que a auto-estrada está deserta e a estrada nacional está cheia de camiões?


- Porque assim não pagam portagem.


- E porque são quase todos espanhóis?


- Vêm trazer-nos comida.


- Mas vocês não têm agricultura?


- Não: a Europa paga-nos para não ter. E os nossos agricultores dizem que produzir não é rentável.


- Mas para os espanhóis é?


- Pelos vistos...


Ela ficou a pensar um pouco e voltou à carga:


- Mas porque não investem antes no comboio?


- Investimos, mas não resultou.


- Não resultou, como ?


- Houve aí uns experts que gastaram uma fortuna a modernizar a linha Lisboa-Porto, com comboios pendulares e tudo, mas não resultou.


- Mas porquê?


- Olha, é assim: a maior parte do tempo, o comboio não 'pendula'; e, quando 'pendula', enjoa de morte. Não há sinal de telemóvel nem Internet, não há restaurante, há apenas um bar infecto e, de facto, o único sinal de 'modernidade' foi proibirem de fumar em qualquer espaço do comboio. Por isso, as pessoas preferem ir de carro e a companhia ferroviária do Estado perde centenas de milhões todos os anos.


- E gastaram nisso uma fortuna?


- Gastámos. E a única coisa que se conseguiu foi tirar 25 minutos às três horas e meia que demorava a viagem há cinquenta anos...


- Estás a brincar comigo!


- Não, estou a falar a sério!


- E o que fizeram a esses incompetentes?


- Nada. Ou melhor, agora vão dar-lhes uma nova oportunidade, que é encherem o país de TGV: Porto-Lisboa, Porto-Vigo , Madrid -Lisboa... e ainda há umas ameaças de fazerem outro no Algarve e outro no Centro.


- Mas que tamanho tem Portugal , de cima a baixo?


- Do ponto mais a norte ao ponto mais a sul, 561 km.


Ela ficou a olhar para mim, sem saber se era para acreditar ou não.


- Mas, ao menos, o TGV vai directo de Lisboa ao Porto ?


- Não, pára em várias estações: de cima para baixo e se a memória não me falha, pára em Aveiro, para os compensar por não arrancarmos já com o TGV deles para Salamanca ; depois, pára em Coimbra para não ofender o prof. Vital Moreira, que é muito importante lá; a seguir, pára numa aldeia chamada Ota, para os compensar por não terem feito lá o novo aeroporto de Lisboa; depois, pára em Alcochete, a sul de Lisboa, onde ficará o futuro aeroporto; e, finalmente, pára em Lisboa, em duas estações.


- Como : então o TGV vem do Norte, ultrapassa Lisboa pelo sul, e depois volta para trás e entra em Lisboa?


- Isso mesmo.


- E como entra em Lisboa?


- Por uma nova ponte que vão fazer.


- Uma ponte ferroviária?


- E rodoviária também: vai trazer mais uns vinte ou trinta mil carros todos os dias para Lisboa.


- Mas isso é o caos, Lisboa já está congestionada de carros!


- Pois é.


- E, então?


- Então, nada. São os especialistas que decidiram assim.


Ela ficou pensativa outra vez. Manifestamente, o assunto estava a fasciná-la.


- E, desculpa lá, esse TGV para Madrid vai ter passageiros? Se a auto-estrada está deserta...


- Não, não vai ter.


- Não vai? Então, vai ser uma ruína!


- Não, é preciso distinguir: para as empresas que o vão construir e para os bancos que o vão capitalizar, vai ser um negócio fantástico! A exploração é que vai ser uma ruína - aliás, já admitida pelo Governo - porque, de facto, nem os especialistas conseguem encontrar passageiros que cheguem para o justificar.


- E quem paga os prejuízos da exploração: as empresas construtoras?


- Naaaão! Quem paga são os contribuintes! Aqui a regra é essa!


- E vocês não despedem o Governo?


- Talvez, mas não serve de muito: quem assinou os acordos para o TGV com Espanha foi a oposição, quando era governo...


- Que país o vosso! Mas qual é o argumento dos governos para fazerem um TGV que já sabem que vai perder dinheiro?


- Dizem que não podemos ficar fora da Rede Europeia de Alta Velocidade.


- O que é isso? Ir em TGV de Lisboa a Helsínquia?


- A Helsínquia, não, porque os países escandinavos não têm TGV.


- Como ? Então, os países mais evoluídos da Europa não têm TGV e vocês têm de ter?


- É, dizem que assim entramos mais depressa na modernidade.


Fizemos mais uns quilómetros de deserto rodoviário de luxo, até que ela pareceu lembrar-se de qualquer coisa que tinha ficado para trás:


- E esse novo aeroporto de que falaste, é o quê?


- O novo aeroporto internacional de Lisboa, do lado de lá do rio e a uns 50 quilómetros de Lisboa.


- Mas vocês vão fechar este aeroporto que é um luxo, quase no centro da cidade, e fazer um novo?


- É isso mesmo. Dizem que este está saturado.


- Não me pareceu nada...


- Porque não está: cada vez tem menos voos e só este ano a TAP vai cancelar cerca de 20.000. O que está a crescer são os voos das low-cost, que, aliás, estão a liquidar a TAP.


- Mas, então, porque não fazem como se faz em todo o lado, que é deixar as companhias de linha no aeroporto principal e chutar as low-cost para um pequeno aeroporto de periferia? Não têm nenhum disponível?


- Temos vários. Mas os especialistas dizem que o novo aeroporto vai ser um hub ibérico, fazendo a trasfega de todos os voos da América do Sul para a Europa: um sucesso garantido.


- E tu acreditas nisso?


- Eu acredito em tudo e não acredito em nada. Olha ali ao fundo: sabes o que é aquilo?


- Um lago enorme! Extraordinário!


- Não: é a barragem de Alqueva, a maior da Europa.


- Ena! Deve produzir energia para meio país!


- Praticamente zero.


- A sério? Mas, ao menos, não vos faltará água para beber!


- A água não é potável: já vem contaminada de Espanha.


- Já não sei se estás a gozar comigo ou não, mas, se não serve para beber, serve para regar - ou nem isso?


- Servir, serve, mas vai demorar vinte ou mais anos até instalarem o perímetro de rega, porque, como te disse, aqui acredita-se que a agricultura não tem futuro: antes, porque não havia água; agora, porque há água a mais.


- Estás a dizer-me que fizeram a maior barragem da Europa e não serve para nada?


- Vai servir para regar campos de golfe e urbanizações turísticas, que é o que nós fazemos mais e melhor.


Apesar do sol de frente, impiedoso, ela tirou os óculos escuros e virou-se para me olhar bem de frente:


- Desculpa lá a última pergunta: vocês são doidos ou são ricos?


- Antes, éramos só doidos e fizemos algumas coisas notáveis por esse mundo fora; depois, disseram-nos que afinal éramos ricos e desatámos a fazer todas as asneiras possíveis cá dentro; em breve, voltaremos a ser pobres e enlouqueceremos de vez.


Ela voltou a colocar os óculos de sol e a recostar-se para trás no assento. E suspirou:


- Bem, uma coisa posso dizer: há poucos países tão agradáveis para viajar como Portugal ! Olha-me só para esta auto-estrada sem ninguém!



quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009


"Eu nunca vi um animal selvagem sentir pena de si mesmo, Um pássaro cairá congelado e morto de um galho sem nunca ter sentido pena de si mesmo."

D. H. Lawrence